30 de junho de 2010

O Desafio das Megacidades

Há cem anos, apenas 10% da população mundial vivia em cidades. Atualmente, somos mais de 50%, e até 2050, estima-se seremos mais de 75%. A cidade é o lugar onde são feitas todas as trocas, dos grandes e pequenos negócios à interação social. É onde a cultura abrange e interliga as nações de todo o planeta. Mas também é o lugar onde há um crescimento desmedido das favelas e do trabalho informal: estima-se que dois em cada três habitantes viva em favelas ou "sub-habitações". Assim, a cidade é também palco de transformações dramáticas que fizeram emergir as megacidades do século XXI: as cidades concentradoras de grande parte da população mundial com mais de 10 milhões de habitantes.

Em época de imperativa preocupação com o desenvolvimento sustentável, é de se destacar que 2/3 do consumo mundial de energia se dá nas cidades e aproximadamente 75% de todos os resíduos gerados ocorrem nas cidades. Portanto, falar em mudanças climáticas, aquecimento global e sustentabilidade é falar de cidades sustentáveis. As metrópoles são o grande desafio estratégico do planeta neste momento. Se elas adoecem, o planeta fica insustentável.

Nas décadas recentes, tem-se observado uma emergência comum às grandes metrópoles mundiais: os antigos espaços urbanos centrais estão perdendo boa parte de suas funções produtivas, tornando-se obsoletos e, assim, verdadeiros guetos de degradação urbana, social e ambiental.

No entanto, experiências internacionais como de Barcelona, Portland, Nova Iorque e Bogotá mostram que as metrópoles se reinventam, se refazem. Ou seja, mesmo as grandes cidades - metrópoles complexas e superpopulosas - podem se reinventar e conquistar mais qualidade de vida e serem mais sustentáveis e includentes.

Um dos maiores estudiosos das cidades – Peter Hall costuma dizer que
"inovação urbana importa tanto quanto infraestrutura urbana".

As metrópoles são o locus da diversidade – da economia à ideologia, passando pela religião e cultura. E isso gera inovação. Portanto, cuidar de direcionar esforços e recursos para regenerar territórios centrais e dotá-los de amplas quantidades de habitação coletiva, construídos rapidamente através de sistemas industrializados, do que preocupar-se com a arborização ou mobiliário urbano de bairros ricos. As maiores cidades do hemisfério norte descobriram isso já há alguns anos e têm se beneficiado enormemente – inclusive em termos da atração de novos investimentos – desse diferencial, dessas externalidades espaciais. Não há cidade sustentável sem a desejável sociodiversidade territorial. E têm promovido seus projetos de regeneração urbana através de políticas de inovação urbana. Centros urbanos diversificados, em termos de população e usos, com empresas ligadas à nova economia, têm se configurado nas novas oportunidades de inovação urbana em áreas anteriormente abandonadas. E cidades sustentáveis são, necessariamente, compactas, densas.

Como se sabe, maiores densidades urbanas representam menor consumo de energia per capita: em contraponto ao modelo Beleza americana de subúrbios espraiados no território, com baixíssima densidade, as cidades mais densas da Europa e Ásia são hoje modelos na importante competição internacional entre as global green citie, justamente pelas suas altas densidades e diversidade de usos. Assim, parece evidente o papel único das metrópoles na nova rede de fluxos mundial e processos inovadores. O potencial do território central regenerado e reestruturado produtivamente é imenso na nova economia, desde que planejado estrategicamente.

Sob o prisma do desenvolvimento urbano sustentado, voltar a crescer para dentro da metrópole e não mais expandi-la é altamente relevante: reciclar o território é mais inteligente do que substituí-lo. Reestruturá-lo produtivamente é possível e desejável no planejamento estratégico metropolitano. Ou seja: regenerar produtivamente territórios metropolitanos existentes deve ser face da mesma moeda dos novos processos de inovação econômica e tecnológica.

Uma agenda possível para tornar nossas cidades sustentáveis deveria incorporar as seguintes premissas:

- A cidade é "a" pauta atual: o século XIX foi dos impérios, o século XX das nações, o século XXI é das cidades.

- As megacidades são o futuro do planeta "urbano" e devem ser vistas como oportunidade ao invés de problema, pois o desenvolvimento sustentável se apresenta mais urgente onde moram as causas da problemática contemporânea.

- As cidades se reinventam. Afinal, elas não são fossilizadas: as melhores cidades, aquelas que continuamente sabem se renovar, funcionam similarmente a um organismo, quando adoecem, se curam, mudam. Refazê-la ao invés de expandi-la. Compactá-la. Deixá-la mais sustentável é transformá-la numa rede estratégica de núcleos policêntricos compactos e densos, otimizando infraestruturas e liberando territórios verdes.

- Sustentabilidade desmistificada. Desenvolver com sustentabilidade pressupõe crença no progresso humano. Acreditar na evolução do conhecimento, das técnicas e das tecnologias humanas. Uma postura estrategicamente proativa, adoção de medidas e parâmetros "verdes" como medidas mitigadoras que visam uma melhor "pegada" ecológica urbana.


Referência:

Conferência Internacional de Cidades Inovadoras – Curitiba, Março de 2010.

O futuro das cidades – Le Monde Diplomatique Brasil, Ano 3/Número 32, Março de 2010.

Quinto fórum urbano mundial – Rio de Janeiro, Março de 2010.